sábado, 23 de maio de 2015

To Ku or not to Ku - Haicai Combat e Poetry Slam.



Em 2014 o Beco de Escritores (*) foi convidado para participar da OFF FLIP em Paraty onde fizemos uma instalação e um sarau com o tema "Partidas", um pré-lançamento do livro com mesmo nome. Na mesma semana haveria um Haikai Combat. Bom...eu não sabia muito bem o que era aquilo e acabei me inscrevendo, para brincar e principalmente para me relacionar com outras pessoas que curtissem haicai.
Lá conheci a Yassu Nogushi, arrumando as cadeiras no salão do casarão da Câmara dos Vereadores. Ela foi muito simpática comigo e me acolheu super bem. Esse pessoal é do Rio de Janeiro e criou um evento chamado Haicai Combat. Esse evento foi idealizado por Marcos Bassini e Yassu Nogushi e inspirado e apadrinhado no Menor Slam do Mundo, criado pelo poeta performático Daniel Minchoni.
Eu, que tenho ficado com a cabeça enfiada na literatura japonesa do século XVI, XVII e XVII, viajando nas bases clássicas do haiku, contemplativa, zen, apegada às regras, ao kigo e às estações do ano, levei embaixo do braço alguns haicais sobre sazonalidade de frutas e verduras, porque estou fazendo um livro sobre isso.
Quando chegaram os outros concorrentes, eu era o verdadeiro peixe fora d´água. E olha que eu achava que entendia um pouco sobre haicai. Chegou uma galera com estilo hiphop, meio na pegada de Sarau da Cooperifa, com tercetos cheios de swing e temática social...e eu falando de agrião!
Para saber como me sentí, veja a cena que Renée Zellweger vai a uma festa de família vestida de coelhinha da Playboy no filme O Diário de Bridget Jones - baseado no livro da britânica Helen Fielding.
Lógico que tomei logo um nocaute dos outros concorrentes e tentei sair com um pouco de dignidade. Mas fiquei me perguntando…porra? Isso aí é haicai?
Então comecei a pesquisar um pouco e descobri umas coisas bem interessantes que queria compartilhar.
Quem se interessa por haicai sabe que talvez o maior mestre tenha sido o Bashô, ele mesmo foi um cidadão rebelde, angustiado, desafiador do status quo. O primeiro livro do Bashô publicado em 1672 foi o Jogo das Conhas do Mar. Ainda não achei esse livro traduzido em português, mas eu fico fuçando muito em sites americanos – e o conteúdo deles é muito maior que o nosso.
Esse Jogo das Conchas, é o tatatataravô japa do Haicai Combat. O Bashô ficava com os amigos dele em um desafio de 3 haicais cada comparando quais eram os melhores (aí o que muda em relação aos dias de hoje são os critérios de julgamento– porque o certo e o errado, o bonito e o feio mudam com o tempo e com o olhar).
O nome Jogo das Conchas vem de uma brincadeira que as criancinhas japonesas fazem ao catar conchinhas do mar e comparar quais são as mais bonitas. Colocam as selecionadas em uma pilha e vão comparando e comparando até chegarem às melhores de todas.
Misturado com o Slam – a poesia falada e performática – gerou o mestiço Haicai Combat.
Há 16 anos em Ann Arbor, no estado do Michigan fazem um campeonato de Head-to-head Haiku, que é uma espécie de Combat e que foi coroado no concurso nacional de Slam de Poesia nos USA onde o Slam é institucionalizado e existe até escola de Slam. Existem campeonatos mundiais de Poetry Slam cujas origens, se a gente for cutucar,  vai chegar à Grécia antiga e se bobear nas rodas em volta das fogueiras dentro das cavernas ancestrais.
Head-to-Head Haiku assim como os haicais do pessoal do Haicai Combat tem uma temática política, filosófica, cômica, absurda, erótica e até de horror.
O título desse post foi baseado em um artigo do americano de origem nipônica, Tazuo Yamaguchi, que organiza o Head-to-Head Haiku, que ele abrevia e chama de “Ku”. http://snn.poetryslam.com/featured-articles/to-ku-or-not-to-ku/
E sabe como eles jogam? Seguindo as regras do Jogo das Conchas do Bashô.
Respondendo então à minha pergunta. Mas afinal aquele Slam de poesia onde eu havia me enfiado era haicai?

Mano…e não é que era?

(*) Beco de Escritores é um grupo composto em sua maioria por contistas e que se reúne desde 2011 na Vila Madalena, em São Paulo.

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